Sevilha, 22 mai (Lusa) - Duas vítimas do franquismo manifestaram à Lusa, em Sevilha, a sua incredulidade por o Tribunal Supremo ter aceitado "uma denúncia dos verdugos, contra o juiz que quis representar as vítimas".
Concha Ramírez, 86 anos, e Juan António Velasco, 84, ambos vítimas da ditadura franquista, seguem com perplexidade o desenvolvimento do processo de que é alvo o juiz Baltasar Garzón.
Ambos participaram numa conferência esta semana em Sevilha, onde falaram das suas vidas perante uma plateia de mais de 50 alunos da escola secundária de Nervión, em Sevilha, um evento enquadrado nos "Encontros com a Memória Histórica", promovido pela Associação Arquivo Guerra e Exílio, encerrados na sexta feira.
Para Concha Ramírez, os recentes acontecimentos, que levaram Garzón ao banco dos réus, são um sintoma de que "a democracia [espanhola] se está a degradar muito rapidamente" e de que "isto volta para trás". Chegou a estar "doente por saber que os falangistas têm o direito de condenar um juiz tão bom", a quem "não deixam fazer o seu trabalho como é devido".
O rosto de Juan António Velasco é uma expressão de dor quando fala sobre Garzón. "Na minha família foi horroroso o que mataram de gente", e não é compreensível que "o juiz mais valente de Espanha" esteja prestes a ser julgado por investigar os crimes do franquismo.
Garzón "foi o único que enfrentou todos os poderes para aclarar uma página da História de Espanha", que segundo Velasco é essencial que se investigue "porque se deve saber e para que não volte a passar-se".
Velasco esclarece que "não há nenhuma intenção de vingança", apenas deseja "dignificar o esforço" durante a luta contra a ditadura franquista.
Concha Ramírez era uma criança quando começou a guerra civil espanhola, a 18 de julho de 1936. Filha de um coronel republicano, vivia em Madrid com a família quando começaram os bombardeamentos.
Decidiram fugir da cidade e viajaram para Valência, depois para Barcelona, e em fevereiro de 1939, já no final da guerra, atravessaram a fronteira para França.
Depois de inúmeras vicissitudes, acabaram por instalar-se na "casa de um comunista" com quem Cocha Ramírez se viria a casar depois este ter "passado pelo campo de concentração de Flossenbürg", na Baviera alemã.
Após 40 anos de exílio, Concha vive atualmente em Espanha, numa aldeia da província de Sevilha.
A vida de Juan António Velasco ficou marcada para sempre no dia em que as tropas rebeldes entraram na aldeia de El Saucejo, a 4 de setembro de 1936. Apenas quatro dias depois, o pai, que seguindo a tradição familiar era professor, "foi fuzilado com cinco ou seis mulheres" e "enterrado na vala comum da aldeia". A mãe foi perseguida e um tio também foi fuzilado.
Quando era um adolescente, Juan António envolveu-se "no movimento de resistência", em Sevilha, e acabou por ser detido, com 19 anos, por pertencer ao movimento sindical e às Juventudes Socialistas Unificadas.
Apesar de não ter sofrido penas muito longas, afirma conhecer "bem todos os órgãos de repressão, como a polícia ou a Guarda Civil", que o interrogaram e torturaram repetidas vezes.
Bruno Rascão, para a Agência Lusa
*** Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico ***
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